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8 de junho de 2019Mobilidade urbana
“Uma boa cidade não é aquela em que até os pobres andam de carro, mas aquela em que até os ricos usam transporte público. Cidades assim não são uma ilusão hippie. Elas já existem” (Enrique Peñalosa, ex-prefeito de Bogotá, capital da Colômbia).
Deslocar-se de um ponto a outro nas grandes cidades brasileiras tem sido, cada vez mais, uma prova de paciência e superação de obstáculos. Meios de transporte que já foram a solução para um deslocamento mais rápido e eficiente, como os automóveis, por exemplo, atualmente são os grandes vilões do trânsito, causadores de engarrafamentos imensos, ruídos e poluição atmosférica
Em nosso país, o transporte público, uma alternativa lógica à utilização do automóvel, é considerado ineficiente, moroso, as passagens são caras, muitos veículos apresentam-se em condições precárias e há insuficiência de linhas de ônibus e metrô.
Destaca-se que as grandes manifestações realizadas no ano de 2013, que se espalharam por várias cidades brasileiras, tiveram como motivação inicial o reajuste no preço das passagens de ônibus.
Além de abusar da paciência do usuário, o tempo gasto no trânsito é assustador. Pesquisa realizada pelo Serviço de Proteção ao Crédito (SPC) e Confederação Nacional dos Dirigentes Lojistas (CNDL), divulgada no ano de 2018, revelou que os moradores das grandes cidades gastam em seu deslocamento no trânsito uma média diária de duas horas e vinte e oito minutos. Em um ano, gastam 37 dias e meio, ou seja, as pessoas perdem mais de um mês se deslocando no trânsito, anualmente.
Lembrando o bordão de um velho ditado que preconiza que ‘tempo é dinheiro’ e levando-se em consideração que um trabalhador no interior de um veículo é improdutivo (ressalvando quem vive do transporte de passageiros), certamente esse problema acarreta prejuízos econômicos ao nosso país. Foi o que revelou uma pesquisa conduzida pela Fundação Getúlio Vargas (FGV), publicada no ano de 2015, que destacou o prejuízo anual de 62 bilhões de reais à economia brasileira, aliado as más condições de mobilidade e planejamento urbano
Na tentativa de melhorar essa realidade, em 2012, foi promulgada a Lei 12.587, conhecida como Lei da Mobilidade Urbana, que delega, aos municípios com mais de 20 mil habitantes, a função de elaborar políticas públicas que favoreçam o crescimento das cidades de forma ordenada e sustentável. A despeito da lei, por enquanto permanecemos longe das boas experiências vivenciadas nessa área por outros países.
Um bom exemplo é o metrô da cidade chinesa de Xangai. Com menos de 30 anos de existência, possui 637 quilômetros de extensão, 17 linhas e 387 estações. O de São Paulo, o maior do Brasil e que teve a primeira linha inaugurada em 14 de setembro de 1974 (mais antigo, portanto, do que o de Xangai), possui 96 quilômetros de extensão, conta com apenas seis linhas e 85 estações. Quanta diferença!
Um caso interessante de mobilidade urbana desejável é a utilização de bicicletas nas cidades. Esse veículo é uma ótima alternativa por ser um meio de transporte barato, silencioso e sustentável. Além disso, favorece a saúde ao queimar calorias e manter a forma física. Na Holanda, líder mundial nesse quesito, nove em cada 10 pessoas utilizam a bicicleta para se locomoverem nas cidades. Na Dinamarca, 70% da população faz uso desse veículo como meio de transporte. No Brasil, embora a utilização da bicicleta pelas pessoas seja menor do que naqueles países, o seu uso vem crescendo nos últimos anos. São Paulo e Rio de Janeiro são cidades que se destacam, pois, juntas, possuem quase 1.000 Km de vias cicloviárias. No entanto, ainda se distanciam de cidades como Pequim (China) e Freiburg (Alemanha), cujo número de bicicletas é o dobro de automóveis
Freiburg, conhecida mundialmente pelo seu ótimo sistema de transportes públicos, apresenta infraestrutura urbana favorável ao ciclista. Os estacionamentos para carros são raros no centro da cidade, enquanto os de bicicleta são incontáveis.
Já no Brasil, sobram ruas esburacadas, falta sinalização em cruzamentos, a sujeira é comum nas vias públicas, não raro encontram-se tampas de bueiros desniveladas, não é difícil encontrar ciclovias mal conservadas e, para completar, os motoristas de veículos automotores costumam desrespeitar o espaço do usuário de bicicleta.
Enrique Peñalosa (cuja epígrafe foi citada no começo do artigo), em apenas quatro anos como prefeito de Bogotá (1998 – 2001), fez uma verdadeira revolução de mobilidade urbana na capital colombiana, priorizando, por exemplo, a utilização de bicicletas em detrimento dos automóveis. O ex-prefeito desconstruiu o discurso de que são necessários muitos anos para se realizar grandes transformações no sistema viário de uma grande cidade.
Devemos nos espelhar nos países cuja mobilidade urbana é realmente valorizada no planejamento das cidades. Nestes, o transporte público sempre é priorizado em detrimento do automóvel particular, os espaços públicos são planejados para servirem às pessoas em vez dos carros, e há política de incentivo fiscal para aquisição de veículos mais eficientes em economia de combustível e emissão de gases poluentes.
Cabe ainda destacar um detalhe importante ligado a esse tema e que é constantemente negligenciado nas cidades brasileiras – a acessibilidade nas vias públicas para atender as pessoas com deficiência de locomoção. Sem dizer a falta de educação apresentada por aqueles que estacionam em vaga para deficientes ou em frente às rampas de acesso às calçadas.
Uma pessoa presa em um engarrafamento ou que é obrigada a pegar vários ônibus para chegar ao trabalho, não perde somente a sua paciência e o seu ânimo, mas também perde tempo de vida, que poderia ser melhor aproveitado em seu trabalho ou curtindo seus familiares em casa. Por isso, não se planeja espaços em uma cidade moderna sem buscar soluções para os seus problemas de mobilidade urbana. É um investimento que evita prejuízos ao erário público e garante qualidade de vida aos seus cidadãos